Há muita discussão com relação à devolução integral ou parcial da matrícula em caso de cancelamento por parte do aluno antes ou depois do início das aulas.
O fato é que não há, na lei, qualquer dispositivo que aborde especificamente o assunto, sendo, portanto, a lei, omissa com relação à devolução integral ou parcial ao aluno que desiste do curso para o qual se matriculou.
Por outro lado, o Artigo 5º, II da Constituição Federal é claro ao determinar que:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;”
Assim, se a lei não veta a retenção, não há que se falar em ilegalidade no ato da Instituição de Ensino, em reter um percentual sobre o valor pago pelo aluno referente à matrícula em caso de desistência unilateral.
Vale lembrar que a partir do momento em que o aluno efetua a sua matrícula perante a Instituição de Ensino, inicia-se uma prestação de serviços no âmbito administrativo da Instituição de Ensino.
Em verdade, o aluno, ao proceder a sua matrícula, tem a sua vaga totalmente garantida para o curso em que se matriculou. Com a efetivação da matrícula o aluno está “reservando” uma vaga que poderia ser disponibilizada para outro estudante, caso o mesmo não tivesse efetuado a sua matrícula.
Por tudo isso, entendemos que é cabível a retenção, por parte da Instituição de Ensino, de um percentual do valor da matrícula, à título de ressarcimento dos serviços administrativos prestados pela Instituição de Ensino ao aluno.
Na prática, as Instituições de Ensino costumam devolver para o aluno de 50% (cinqüenta por cento) a 80% (oitenta por cento) do valor da matrícula.
Neste sentido, há entendimentos do Colégio Recursal:
“CONTRATO – Prestação de serviços educacionais – Curso de Nutrição – Desistência manifestada antes do início das aulas perante o PROCON – Obrigação de restituição de parte do valor pago a título de matrícula – Recurso parcialmente provido”
“A devolução da quantia paga a título de matrícula, entretanto, não deve ser integral.
Não se pode olvidar que a Universidade prestou serviços de caráter administrativo à contratante e esta, durante o período de validade da reserva, ocupou vaga que poderia ter sido disponibilizada para outro aluno.
Ademais, pelo que consta, a recorrente cumpriu sua obrigação, mantendo a vaga reservada durante o período convencionado, à disposição do candidato, tendo iniciado o curso na época prevista.
Nessas condições, cumpre à recorrida a obrigação de pagar pelos serviços prestados, embora não tenham sido de cunho pedagógico.
Basta folhear os autos para verificar a prática de vários atos administrativos por parte da Universidade em favor da recorrida.
A importância paga a título de matrícula não deve, pois, ser devolvida integralmente, devendo ser reservada quantia equivalente a 50% para pagamento dos serviços administrativos efetivamente prestados, sob pena de enriquecimento sem causa, na medida em que os serviços não pedagógicos foram usufruídos.”
(Recurso Inominado nº 989.09.004586-6, Voto nº 2177/09, Juíza Rel. Maria do Carmo Honório, DJ 31.03.2009) (grifos nossos)
“Ementa: Contrato de Prestação de Serviços Educacionais. Cancelamento de matrícula. Devolução do valor correspondente a oitenta por cento da quantia paga. Apelação Parcialmente Provida.”
“Desta forma, é cabível a rescisão do contrato com devolução de 80% (oitenta por cento) do valor da matrícula e demais prestações, descontada a importância de 20% (vinte por cento) a título de compensação pelos serviços administrativos prestados.”
(Apelação nº 885380-0, 34º Câmara, Rel. Des. Nestor Duarte, DJ 09.08.06) (grifos nossos)
Também este é o entendimento jurisprudencial:
“Centro de Educação Superior. Desistência do aluno. Devolução correspondente a oitenta por cento da taxa de matrícula. Retenção de vinte por cento.
Para ressarcimento dos gastos administrativos, assegura- se ao centro de ensino a retenção de 20% da taxa de matrícula a ser restituída ao aluno desistente.” (grifos nossos)
(20000110529383ACJ, Rei. Fernando Habibe, B Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do D.F., DJ 27/05/2002, p. 46).
Caso as aulas já tenham sido iniciadas, o entendimento é de que o aluno não tem direito à devolução de percentual algum, conforme transcrevemos a seguir:
“Contrato de prestação de serviços educacionais – Rescisão – Devolução do valor pago a título de matrícula – Descabimento – Pedido feito em desacordo com o contrato – Arras penitenciais – Recurso improvido. Não é abusiva a cláusula contratual que condiciona a devolução do valor da matrícula a pedido de desistência formulado até o início do ano letivo, pois preserva o equilíbrio contratual e o interesse das partes” (Recurso nº 989.09.003225-0, Voto nº 2241, Juiz Claudio Lima Bueno de Camargo, DJ 12.03.09) (grifos nossos)
Pelo fato de a lei não prever percentual de devolução no caso do aluno cancelar a sua matrícula, há também entendimentos jurisprudenciais no sentido contrário, prevendo a impossibilidade de retenção de percentual, o que se dá pelo fato de o magistrado entender que não houve prestação de serviço educacional ao aluno.
Com relação ao Procon, o referido órgão entende que caso as aulas não tenham sido iniciadas, é cabível a retenção por parte da Instituição de Ensino de um percentual do valor da matrícula em função das despesas administrativas, desde que o aluno tenha sido previamente informado e que a Instituição de Ensino justifique a retenção do percentual.
Diante de todo o exposto, resta cristalino que não há legislação específica que trata a respeito da questão do percentual de devolução no caso de cancelamento da matrícula por parte do aluno.
Entretanto, conforme entendimentos jurisprudenciais e entendimento também do Procon, uma vez não iniciadas às aulas, entendemos que é cabível a retenção por parte da Instituição de Ensino de parte do valor da matrícula, tendo em vista os serviços administrativo prestados pela Instituição de Ensino ao aluno. Tal pedido deve ser formulado pelo aluno antes do início das aulas, pois caso o pedido seja formulado após o início das aulas, estamos falando de desistência e não de cancelamento, devendo o mesmo pagar a mensalidade do mês em que fez o pedido, mas isto é assunto para outro artigo.